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domingo, 12 de outubro de 2008

O LADO FEMININO DA GLOBALIZAÇÃO


Encontro debate o lado feminino da globalização
Apesar das dificuldades, sociedade contemporânea ganha contornos mais condizentes com universo das mulheres

12/10/2008 - 12h40 .

Janete Trevisani

Um público atento, formado por 480 pessoas, mais mulheres do que homens, participou do encontro da jornalista Mônica Waldvogel com o psicanalista Jorge Forbes no Café Filosófico da CPFL, em Campinas. Os dois falaram sobre o medo das mulheres. Na semana seguinte, quem fez palestra sobre anorexia, bulimia, angústia e depressão para encerrar o módulo A Globalização é Feminina? foi o psicanalista Ariel Bogochvol. “Por que as mulheres, no momento que têm a chance de reinar no espaço tão almejado por elas, estão adoecendo?”, questionou Forbes, o curador do módulo, que sacudiu as alas feminina e masculina, nas sextas-feiras de setembro, com dúvidas e certezas sobre a sociedade contemporânea.

Presidente do Instituto da Psicanálise Lacaniana e diretor do Projeto Análise, o psicanalista Jorge Forbes concluiu que o mar da globalização está muito mais para o peixe mulher do que para o peixe homem. Diante disso, elas deveriam estar nadando de braçadas, mas não estão. “Ao contrário do que aconteceu no século 20, a mulher moderna perdeu a possibilidade de se queixar. A mulher anterior dizia que não era feliz porque faltava a ela uma série de possibilidades que a sociedade não lhe dava. Era uma mulher que reclamava. Hoje, depois das conquistas, está muito mais na mão de cada uma se responsabilizar pelo exercício da sua felicidade, o que é uma tarefa bem mais difícil. É muito mais fácil ficar na posição de quem reclama; dizer ‘se não fosse você, eu seria mais feliz’.” Segundo ele, depois de tantas conquistas, vem uma tarefa ainda mais difícil para as mulheres: usufruir delas. “A maior diferença entre a mulher doséculo anterior e deste é que a primeira reivindicava seu lugar, enquanto a atual tem que conquistar esse lugar”, disse.

Por incrível que pareça, a jornalista Mônica Waldvogel tem medo de falar em público e, por isso, fez algumas exigências contratuais para comparecer ao encontro. Veio acompanhada de Jorge Forbes para sentir-se mais à vontade e só deu para perceber a sua “saia justa” diante da platéia numerosa pelo fato de ela ter admitido o seu temor. Discreta e elegante, vestida em tons de cinza, unhas vermelhas, anel grande na mão direta e brincos de argola, sentou-se ao lado do psicanalista, que mostrou-se atual também no quesito moda: usava calça xadrez, paletó e blusa pretos.

A apresentadora do programa Saia Justa, do GNT, e do Jornal das Dez, da Globo News, recebeu elogios de um homem da platéia que a achou mais bonita pessoalmente e iniciou o bate-papo falando de um medo que as mulheres não confessam: o medo das outras mulheres. “As mulheres são sabedoras dessa falta, desse buraco que temos. A pergunta que cada uma se faz é: ‘Como ela preencheu o buraco dela, o que ela tem que eu não tenho?’.” Os homens também têm medo das mulheres, como o próprio Forbes confirmou, ao exemplificar: “Medo de estranheza, de descontrole, de não saber por onde vai reagir. Medo de ser tonto.”

Na avaliação da jornalista, as grandes corporações exigem uma uniformização que não é própria das mulheres. Terninho preto, marinho ou bege, tudo igual. Em muitas empresas, as mulheres têm de agir como homens para serem aceitas. Com isso, perdem a identidade (e a feminilidade). As estatísticas mostram que as mulheres não só estudam mais como têm melhor performance que os homens nas áreas em que se debruçam. No entanto, em algum momento, elas desistem. Nos Estados Unidos e também na Europa (o Brasil segue na mesma toada), 45% das executivas abandonam seus cargos quando estão bem perto do auge. Muitas pedem para sair, são promovidas e dizem: “Não é isso o que eu quero para mim”.

“Os homens são parecidos, compartimentados. Os homens constroem uma sinfonia e a democracia, a corporação, o esquema digital, isso é próprio do homem. As mulheres contribuem na conexão humana”, observou Mônica Waldvogel. A apresentadora citou Simone de Beauvoir e Camille Paglia para relembrar um pouco o avanço das mulheres e concluir que ainda é difícil, na terceira geração do feminismo, definir a mulher. Ela gosta de jogar feito o homem? Não. Ela gosta da uniformização? Também não. Longe de ser uma disputa entre homens e mulheres, a palestra foi suave como a jornalista e aproximou os dois sexos com humor, estatísticas e dúvidas.

O Brasil é campeão de livros de auto-ajuda. “Lutamos para chegar até aqui e precisamos comprar a receita de como viver a vida, de como preencher o buraco de dúvidas e inseguranças...?”, questionou Mônica. “As mulheres não precisam de auto-ajuda, não é um bom caminho. Livro de auto-ajuda ajuda mesmo é o autor”, completou Forbes.

Correio Popular, 12 de outubro de 2008.

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