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sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

FELIZ 2008

RECEITA DE ANO NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo...

Não precisa fazer lista de boas intenções para arquivá-las na gaveta.

Não precisa chorar de arrependimento pelas besteiras consumadas, nem parvamente acreditar que por decreto toda esperança será realizada e, a partir de janeiro, as coisas mudem e haja claridade, recompensa, justiça entre os homens e as nações, liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, direitos respeitados, começando pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um ano-novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo.

Eu sei que não é fácil mas tente, experimente, consciente.

É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre.

Um maravilhoso Ano Novo para você !

(Carlos Drummon de Andrade)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Pensamento do mês: Dezembro/2007

Um homem nasce macio e flexível.
Ao morrer, ele está duro e rígido.

Plantas verdes são tenras e cheias de seiva.
Ao morrer, elas estão murchas e secas.

O rígido e o que não cede são discípulos da morte.
Mas os macios e os que cedem são discípulos da vida.

Tao-Te-Ching

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O LOGRO DAS ORQUÍDEAS


Vera Chvatal

Orquídeas! Flores maravilhosas, de uma beleza selvagem, originariamente, elas nasciam e cresciam nas florestas. No meio das matas, em galhos de árvores. Por isso eram chamadas de parasitas. Acreditava-se que elas viviam grudadas nos galhos para sugar a seiva e tirar o seu alimento das árvores onde se hospedavam.

Com o desenvolvimento da botânica, viu-se que não era bem assim. As orquídeas simplesmente apoiavam-se nos galhos das árvores. Em seu processo evolutivo, elas se especializaram em sobreviver sobre outras plantas, geralmente árvores, sem prejudicá-las.

Esse processo chamado epífita, provavelmente, ocorreu para que a orquídea pudesse ter melhores condições de sobreviver. No topo das árvores elas conseguem mais luz, mais ventilação e ficam menos expostas a inundações, queimadas e predadores do que no solo. Dá para imaginar uma orquídea crescendo no chão e sendo pisoteada? Não! Seria um sacrilégio grande demais. E também porque no alto das árvores elas ficam mais visíveis para que os pássaros e insetos possam polinizá-las ajudando a procriação.

Porém, gosto de imaginar que as orquídeas assim o fazem para lá de cima exibir sua beleza pela mata afora. Afinal, orquídeas são flores altivas, misteriosas, elegantes. Se flores são sensuais, a orquídea, certamente, é a rainha da sensualidade. E seu trono é no alto das árvores. De onde pode ser vista e largamente admirada.

Conta a lenda que numa cidade chamada Anam vivia uma formosa jovem chamada Hoan-Lan, que se divertia com o sofrimento de seus numerosos admiradores. Tanto que, muitos deles acabaram com a própria vida após terem sido desprezados por ela. Um dia, o poderoso deus das cinco flechas resolveu castigar tanta maldade e fez com que a volúvel jovem se apaixonasse perdidamente pelo formoso Mun-Say que, no entanto, não queria saber dela. E Hoan-Lan, no seu leito de nácar e sedas bordadas, passou a sofrer com a indiferença do amado.
Em uma noite escura a jovem foi procurar o deus da montanha de Tan-Vien, implorando-lhe para curá-la. Mas o gênio não quis atendê-la, por achar o castigo merecido. Na saída ela encontrou uma bruxa de pés de cabra que lhe prometeu ajudá-la a vingar-se de Mun-Say, em troca de sua alma. E prometeu que ele nunca mais amaria uma mulher. Hoan-Lan aceitou o contrato. A bruxa fez um feitiço com uma folha de palmeira e enterrou-a, pronunciou umas palavras desconhecidas e desapareceu. E Hoan-Lan voltou para casa.

Um dia, vendo de longe seu adorado Mun-Say, ela correu para abraçá-lo. Mas, ao toque de seus braços o jovem transformou-se numa árvore de ébano. E, nesse exato momento, apareceu a bruxa dizendo que ia cobrar o trato que fizeram. Soluçando a jovem caiu aos pés da árvore pedindo perdão e implorando compaixão. Mas a árvore não respondia.
E ela ficou ali parada durante muito tempo, até que por lá passou um gênio que se compadeceu de sua sorte. Colocando um dedo sobre a testa de Hoan-Lan disse-lhe que ela procedera mal, mas a dor havia purificado sua alma. Portanto, estava perdoada. E, antes que a bruxa viesse buscar-lhe a alma, ela seria transformada em uma flor meio esquisita, requintada, dando a impressão de que a sua vida fora maldosa. Quem visse suas pétalas logo saberia que ela teve um espírito caprichoso, volúvel e cruel. Preocupada apenas com a elegância. E concedeu-lhe um último bem: -Não te separarás do bem que adoras e viverás de tua seiva, parasita do teu amado.

Enquanto o gênio falava, a túnica rósea de Hoan-Lan foi empalidecendo e tomando uma delicada cor lilás. Os olhos da jovem brilhavam como pontos de ouro e suas carnes tomaram a tonalidade do nácar. Os seus formosos braços enrolaram-se na árvore, numa derradeira súplica. E ela se transformou numa orquídea.
Mas, orquídeas gostam de calor. O Divino Criador as fez nascer nas florestas úmidas, de clima tropical. O frio as apavora, temem morrer. Então, o criador humano coloca as mudas em estufas com baixas temperaturas durante certo tempo. "Apavoradas", elas produzem botões para dar uma última florada antes de morrer e deixar suas sementes para novas mudas surgirem.

Não é fantástico? Temendo desaparecer sem deixar descendência elas produzem flores, com novas sementes, para imortalizar a espécie. E o ciclo forçado repete-se através da exposição ao frio intenso e depois ao calor. Esse é o logro das orquídeas...

sábado, 27 de outubro de 2007

Aninha e suas pedras

Não te deixes destruir...
Ajuntando novas pedras e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces.
Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha um poema.
E viverás no coração dos jovens e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas e não entraves seu uso aos que têm sede.

Cora Coralina
(Outubro, 1981)

Poema enviado pelo meu amigo André Zanarela.
Achei que valia a pena colocá-lo em meu blog.
Não só pela bela lição de vida que ele transmite mas, principalmente, porque a Cora Coralina é demais!

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Terapia canina




Vera Chvatal

Dizem que o cão é o melhor amigo do Homem. E deve ser mesmo, pois nunca se valorizou tanto a companhia desse animal como atualmente.

Uma amiga que mora na Europa estava passando por uma crise de depressão e seu terapeuta disse-lhe para arranjar um cachorro como companhia. Sugestão aceita ela adotou o André, um enorme cão de caça, peludo, de cor marrom meio avermelhado que vivia num asilo para cães abandonados.

Avisaram-na de que o André era um cão muito carente, pois já fora adotado e devolvido algumas vezes ao asilo. Porém, quem resiste a um amor à primeira vista? E ela levou-o para o seu pequeno apartamento às margens de um charmoso canal de Amsterdã.

O problema surgiu logo nos primeiros dias de convivência. André era um cachorro sofrido, neurótico, que tinha muito medo de ficar sozinho. Não suportava separações. Sua dona não podia mais sair de casa, pois ele latia e uivava ruidosa e, ininterruptamente, enquanto corria desvairadamente pelo apartamento, assustando e incomodando os vizinhos. E à noite era ainda pior.

Conversando com o terapeuta do asilo, ele sugeriu que ela fizesse uma terapia de dessensibilização com o André. Ela deveria sair do apartamento ausentando-se nos primeiros dias por cinco minutos, no segundo dia por dez minutos, depois quinze minutos, e assim sucessivamente. Ela iria aumentando, gradativamente, o tempo em que ficaria fora de casa para o André ir se acostumando com as ausências, sem sofrer. E aprendendo que não estava sendo abandonado.

Acontece que essa terapia canina ia demorar uns meses para surtir efeito. Não havia um prognóstico certo. E minha amiga precisava cuidar da vida, fazer compras, visitar amigos... Durante o dia ela o levava junto por quase toda parte. Quando iam às compras o André ficava aguardando, pacientemente, na porta do supermercado, do correio, das lojas, etc. Porém, à noite, quando ia à academia fazer ginástica, não tinha onde deixá-lo.

Um ritual para driblar o André e poder sair sem maiores problemas foi arquitetado. Nas noites em que tinha academia ela vestia a roupa de ginástica e por cima vestia o pijama. Fazia uns agradinhos no André e depois se punha a bocejar e espreguiçar, simulando que estava com sono e iria dormir.

Dava boa noite entrava no quarto e fechava a porta. Ele ficava uns momentos aguardando do outro lado meio desconfiado. Depois ia para a sua cama que ficava na sala. Silêncio total, o André dormindo, minha amiga tirava o pijama, pulava a janela que dava para um corredor lateral e ia para a academia. Na volta entrava pela janela, punha o pijama e ia para a sala. E o André acordava feliz e festeiro, acreditando que ela estivera no quarto o tempo todo!

Esse ritual se repetiu quantas vezes foi necessário até que o André foi se acostumando com as ausências, sem ter mais ataques de pânico. A terapia canina se revelou um sucesso e eles viveram juntos por um bom tempo.

domingo, 21 de outubro de 2007

HAI KAI - PAZ

Vera Chvatal

Hai Kai, poema japonês de estilo conciso que procura registrar a imagem, o instante, através de imagens concretas, porém, sem revelar sentimentos ou opiniões, apenas sugerindo.

Como este: Pingos de chuva / na noite escura: / notas musicais...



Posted by Picasa


ou este: Na grama verde / uma flor amarela / minha bandeira!


Este livreto de Hai Kai surgiu de minhas andanças matutinas, quando saio para caminhar com minhas Labradoras. De manhãzinha quando o sol nasce, o ar ainda está fresco e a grama orvalhada sob o céu azul. Os pássaros iniciam sua celebração à vida com maviosos trinados. E as maritacas voando em bandos verde-amarelo-azul-anil fazem a maior algaravia.
Tudo é belo e na beleza o coração se expande em emoção e criação. E a imaginação fértil vai captando a simplicidade e a grandeza da Natureza que é a base do Hai Kai.
E o coração se enche de paz! É assim...

Sinfonia dos pássaros

Vera Chvatal

Nada melhor do que deleitar-se, em uma tarde preguiçosa com os sons de uma sinfonia de Mozart, Beethoven, Schubert ou Mahler. As notas musicais se sucedem em movimentos como ondas de um oceano, ora calmas, ora tempestuosas, fazendo vibrar as cordas do coração. Trazendo memórias esquecidas no tempo a música desperta emoções deliciosas, inesquecíveis, conduzindo a alma e a imaginação por caminhos e lugares desconhecidos.

As sinfonias clássicas têm, via de regra, quatro movimentos. Começa com um alegro e depois passa para um movimento mais lento, mais lírico e sonhador que é o adágio. Em seguida vem um movimento mais leve para chegar ao gran finale, rápido, majestoso e, geralmente, apoteótico.

Claro, nem sempre é assim, pois exceções existem para burlar as regras estabelecidas. A Sétima Sinfonia de Sibelius tem apenas um movimento. A Quinta Sinfonia de Mahler e a Pastoral de Beethoven têm cinco movimentos que se sucedem maravilhosamente. E tem as sinfonias inacabadas, mas nem por isso, menos belas. A Oitava Sinfonia de Schubert com dois movimentos é monumental, de uma beleza ímpar.

Mas, por que estou falando de sinfonias? À parte o prazer que elas me proporcionam, dia destes passeando com minhas Labradoras na praça pude desfrutar de uma emoção singular com a sinfonia matinal da passarinhada, que me fez recordar das mais belas sinfonias ouvidas.

Eram seis horas da manhã e o céu azul, sem nuvens, dava um tom outonal à paisagem. O orvalho da noite deixara a relva umedecida e as árvores da praça regurgitavam de bem-te-vis, canários, coleirinhas, pintassilgos, sanhaços e maritacas.

A princípio, me despertou a atenção a algaravia provocada pela passarinhada. Em seguida, por um breve momento, fez-se silêncio longo interrompido por um majestoso bem-te-vi que se pôs a trinar fortemente. De outras partes da praça os demais bem-te-vis responderam em coro. E o som, ora suave, ora mais forte reverberava no ar produzindo ondas de prazer que, através de meus ouvidos, chegavam ao coração.

Os maviosos trinados dos bem-te-vis durou alguns poucos minutos. Fez-se novo silêncio e bandos de canários iniciaram sua performance, acompanhados de alguns bem-te-vis e outros pássaros dando sequência à música que deslizava no ar, junto com a brisa, levemente fria, da manhã. Em tom modulado prosseguiram em seu canto até que, chegando ao gran finale, as maritacas em coro mais rápido, majestoso e apoteótico encerraram a bela sinfonia, magnificamente interpretada, da passarinhada.

Impressionada e com a alma leve e enternecida observei os pássaros em revoada abandonarem a praça. Ficando só com minhas cachorras percebi que lágrimas de emoção deslizavam de meus olhos. Quando se está alerta para as surpresas da natureza e o ritmo da vida, não há momentos sem graça. Senti que aquele maravilhoso concerto fora um presente deslumbrante e inesquecível para celebrar o encantamento do meu dia!

sábado, 20 de outubro de 2007

O ANJO DA SOLIDÃO


Vera Chvatal

No interior de Pernambuco existe uma cidade chamada Solidão que, de tão pequena, nem consta no mapa. Pus-me a conjecturar em como ela seria... Triste, escura, vazia, deserta? Imaginei-me morando lá... Quando alguém me perguntasse : -Onde você mora? Eu diria: -Em solidão!
Mas, o que é solidão? Ser solitário equivale a ser triste? Sentir-se vazio? Viver num deserto? No escuro? Divagando, pensei que solidão tem a ver com o sentimento de se estar só, isolado. No entanto, pode-se sentir sozinho, isolado, mesmo cercado de algumas pessoas ou no meio de uma grande multidão.

Muitas pessoas reclamam desse mal. Têm filhos, amigos, moram em bairros bons, têm vizinhos próximos. E se sentem sós, isoladas, solitárias. E sofrem! E tem outras pessoas que vivem sozinhas e isoladas e não sofrem. Sentem-se bem.

Acho que a solidão não tem mesmo muito a ver com estar ou não estar com outras pessoas. A solidão é uma experiência emocional. Um fenômeno subjetivo. O que importa é sentir-se bem consigo mesmo e com o mundo.

Solidão tem a ver com vínculo, aquilo que ata, liga. E o vínculo é uma experiência emocional que acontece entre as pessoas ou entre a pessoa consigo mesma. Sentir-se vinculado a outra pessoa, a si mesmo ou a algo, dá um sentimento de segurança, estabilidade, permanência.

Como o apelo apaixonado do Rei Salomão ao cantar para a sua amada Sulamita: -Grava-me, como um selo em teu coração, como um selo em teu braço; pois o amor é forte, é como a morte! (Cânt 8,6)

Pensando nisso, resolvi consultar quem entende mesmo das coisas... Os poetas! Pois se até mesmo o pai da psicanálise, Sigmund Freud, reconheceu sua sabedoria: -Seja qual for o caminho que eu escolher, o poeta já passou por ele antes de mim.
Vinicius de Moraes afirma: -A maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a dor do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana. Então, a solidão tem a ver com o desamor. Ela ataca aquele que não se abre para o outro, para a vida, para o amor. Quem não é capaz de amar, sofre de solidão.

A poetiza Gabriela Mistral acrescenta: -É a noite desamparo, das montanhas ao oceano. Porém eu, a que te ama, eu não sinto a solidão. Quem ama não sente a solidão como um fardo, como um sofrimento. Quem ama respeita a liberdade do ser amado. Deixa-o ir para voltar quando e como quiser! E o amor preenche o coração enquanto aguarda o retorno do amado. Mesmo longe se sente ligado pelos laços do amor.

O eterno Fernando Pessoa diz: -Minha mulher, a solidão, consegue que eu não seja triste. Ah, que bom é o coração, ter este bem que não existe. A solidão á como uma mulher, precisa ser amada para não causar dor, sofrimento.

O amor, a saudade, a solidão são companheiros do poeta. Não se pode falar de amor sem falar de saudades, pois quem ama sente saudades. Quando o ser amado se ausenta por um tempo, ou mesmo quando se vai para sempre, o coração se enche de saudades.

Por isso canta Vinicius: -Vai e diz, diz assim, como sou infeliz. No meu descaminho, diz que estou sozinho e sem saber de mim. E o poeta, cantor e compositor Oswaldo Montenegro completa: -Metade de mim é partida / mas a outra metade é saudade.

Partir é preciso, mudar também. E a saudade vai acompanhar quem parte e fazer companhia para quem fica. Alguém já disse que a saudades é a presença de uma ausência. Amor, saudades, solidão! Quanta poesia evoca. E poetizar é bom, faz bem ao coração!

Dentro de mim mora um anjo, doce anjo que se chama solidão. Ouço o ruflar de suas asas, na cadência suave do coração. Seduziu-me esse anjo que em mim mora. Companheiro nas indolentes, mortas horas...
No Cântigo (2,11-13) da Bíblia Sagrada, a partida, a mudança, a saudade são cantadas em verso e prosa junto com a esperança: -Vê o inverno: já passou! Olha a chuva: já se foi! As flores florescem na terra, o tempo da poda vem vindo, e o canto da rola está se ouvindo em nosso campo. Despontam figos na figueira e a vinha florida exala perfume...
E dá para sofrer de solidão com tanta beleza?