Translate

sexta-feira, 19 de março de 2010

O SOPRO DA VIDA...

Rubem Alves 


Digo sem o menor constrangimento que a Raquel, minha filha, é uma mulher extraordinariamente forte, paisagista e arquiteta que faz coisas lindas. Foi ela que planejou e executou minha casa e meus jardins. ( Visite o seu site ....... ) Mas quando nasceu ela era uma criança fraquinha cujos olhos vivos diziam que ela tinha uma enorme vontade de viver.

Tinha uns dois meses. O médico receitou um composto vitamínico com a consistência de uma emulsão. As emulsões, vocês sabem, são pegajosas, não têm consistência líquida, são difíceis de engolir. Aconteceu, então, quando lhe demos a primeira colher da tal emulsão. Ela ficou repentinamente silenciosa, parou de fazer aqueles barulhinhos com a boca que uma criança de dois meses faz. Olhamos por alguns segundos para ela para ver o que estava acontecendo. Nenhum ruído. Ela só nos olhava. Foi então que nos demos conta de que a emulsão estava presa na sua garganta e ela não conseguia respirar. Estávamos, então, diante daquela menininha que queria viver mas estava morrendo à nossa frente sem que nada pudéssemos fazer. Sacudimos, viramos de cabeça para baixo, pressionamos o tórax, demos tapas nas costas, tudo inutilmente.

A Raquel estava morrendo asfixiada diante dos nossos olhos. Foi então que algum anjo me disse: respiração boca a boca! Deitei a Raquel, abri sua boquinha, apliquei a minha boca sobre a dela e soprei. Foi só uma vez. Uma grande inalação de ar encheu os seus pulmões! Ela estava viva! Não me lembro do que sentimos. Nem sei se foi alegria. O nosso medo tinha sido grande demais. Simplesmente caímos ajoelhados ao lado da sua cama e choramos...

Nenhum comentário: