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sábado, 23 de agosto de 2008

UMA RECEITA DIFERENTE DE FELICIDADE


Cercado de gatos...

(Ruy Castro)

Um amigo meu, jornalista em São Paulo, era também conhecido no meio da imprensa por sua adoração a gatos. Em sua bela casa, perto do Embu, ele e a mulher (os dois não tinham filhos) costumavam manter uma média de 15 a 20 gatos, e isto apenas entre os cadastrados – ou seja, os que atendiam pelo nome, tinham seu organograma de vacinas sob rígido controle, e dia certo da semana para aplicação de cotonete nas orelhas. A casa acomodava ainda uma população flutuante de outros tantos gatos de rua que atraídos pela sinfonia de miaus, apareciam para fazer uma visita, confraternizavam com os residentes, punham os estômagos em dia e miavam tchau.

Claro que, com tantos gatos dos mais variados sexos sob o mesmo teto, era um pouco difícil manter o crescimento populacional a zero. Por isso meu amigo vivia sob a constante ameaça de uma explosão demográfica, bastando que um casal mais adulto resolvesse explorar o aconchego de um cantinho quando não havia ninguém olhando. Daí que, exceto pela castração, o jeito era apelar para os anticoncepcionais, mas há gatas que se adaptam a uns e não a outros. E, quando meu amigo se dava conta, havia uma bela ninhada a caminho, numa casa já com todas as vagas ocupadas.

Só lhe restava, então, checar o pedigree dos amigos e conhecidos, e presenteá-los com a gataria que não conseguia absorver. E aí começava o problema. As pessoas relutam em aceitar gatos – unzinho só! - em seus apartamentos ou casas. Sendo o presente um cachorro, abrem-lhe os braços e movem mundos para recebê-lo. Claro, um cachorro é uma gracinha, eu também acho – até o momento em que você descobre que ele não sabe fazer pipi sozinho, tende a lamber excessivamente as visitas de cerimônia e às vezes ataca carteiros inocentes. Gatos não cometem esses pecados, são auto-suficientes, independentes e altivos, além de sensíveis, amorosos e repousantes. Mas, diante do inexplicável preconceito das pessoas, meu amigo do Embu se conformava e acabava absorvendo os excedentes. O que, segundo ele, nunca lhe diminuiu a felicidade.

Mas isso foi há muito tempo e, por vários motivos, passamos aos últimos anos sem nos ver ou falar. Outro dia, reencontrei-o por acaso numa redação. Ele me contou, todo animado, que sua mulher acabara de dar à luz. Dei-lhe os parabéns e perguntei o que tinha sido. Ele respondeu, orgulhoso: “ANGORÁ!”.

Recebido por e-mail do amigo André

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